Professor do Insper e executivo da Opus, Edison Kalaf fala sobre a revolução silenciosa da IA generativa no mundo corporativo, a importância da cultura sobre a tecnologia e por que acredita que, em poucos anos, a inteligência artificial será mais transformadora que a internet.
Você está na Opus desde 1989 e acompanha a evolução da tecnologia há décadas. Como foi esse começo até chegar ao universo da inteligência artificial generativa?
Me formei em Ciência da Computação em 1984 e comecei como desenvolvedor de sistemas. Em 1989, entrei na Opus para cuidar da área de treinamento corporativo. Naquela époica, a gente ensinava SQL Server e programação de bancos de dados. Era um mercado muito bom, ninguém ficava parado. Com o tempo, a Microsoft e outras empresas expandiram a oferta e nós vendemos a área de treinamento. Mas eu nunca larguei o ensino: há mais de 25 anos dou aulas em graduação e pós, e hoje leciono no Insper. Essa paixão por ensinar acabou se conectando com o trabalho atual em Ia generativa, tanto em projetos quanto em consultoria.
Como você tem visto a IA Generativa dentro das empresas?
A IA em geral e a IA generativa em particular são verdadeiros game changers. É um ferramental que atua horizontalmente em todas as áreas de uma organização e verticalmente em processos e projetos específicos. Do lado interno, melhora eficiência operacional em todas as áreas de uma empresa, com funções que vão desde automações industriais à construção de um simples e-mail. Do lado externo, abre novos mercados e muda o jeito de competir. E não é mais sobre custo ou acesso: hoje, a tecnologia virou commodity. A diferença está em como as empresas usam, adotam e constroem uma cultura de uso.

"A inteligência artificial generativa não é apenas mais uma onda tecnológica. É uma mudança cultural profunda, que desafia empresas e governos a repensarem processos, valores e até a forma de aprender.
Não é possível prever o futuro. Mas é possível ajudar a criá-lo".
Edison Kalaf
E por que tantas organizações ainda não conseguem capturar valor com IA?
Porque é, essencialmente, uma mudança cultural, não apenas tecnológica. Não adianta “jogar” a ferramenta nas mãos dos funcionários. Sem treinamento, governança e clareza de uso, o ganho é marginal. Vi uma empresa gastando milhões em licenças de Copilot e ganhando apenas 7% de produtividade. Só quando investiram em capacitação e criaram uma cultura que trazia embaixadores para o tema é que algumas áreas chegaram a alcançar até 70% de ganho de produtividade. O segredo não é a ferramenta em si, mas sim a cultura organizacional.
Como você imagina o dia a dia de um brasileiro comum daqui a cinco anos, em 2030, com a IA generativa já disseminada?
As tarefas sem valor agregado vão desaparecer. Marcar médico, barbeiro, viagem, compras: tudo será automatizado por agentes. Veículos autônomos vão se tornar mais comuns, mudando a lógica do transporte urbano. E no trabalho, a pesquisa bruta será substituída por análise crítica. O diferencial será como você usa a informação, não o acesso em si. Sou um eterno otimista: mais eficiência no setor público, maior capacidade de gestão, menos acidentes, mais segurança. Para mim, a IA será ainda mais transformadora para as próximas gerações do que a internet foi dos anos 2000.
Saindo um pouco do trabalho: como foi sua trajetória pessoal até aqui?
Cresci em Santos, estudei em escola pública e entrei em Ciência da Computação por sugestão de um professor. Estou na Opus há 36 anos e sigo também como professor, hoje praticamente apenas no Insper. Fora do trabalho, gosto muito de filosofia, de caminhar, de xadrez. Vejo a vida como um pacote único — não separo o pessoal do profissional. E acredito que, por onde passarmos, temos a missão de deixar o ambiente melhor do que encontramos.
Você mencionou filosofia. Qual o papel dela na sua vida como alguém que trabalha com tecnologia?
Para mim, a Filosofia abrange todas as outras ciências e me ajuda a colocar a tecnologia em perspectiva. Ler, pensar, refletir: tudo isso dá contexto ao que fazemos no dia a dia. A IA é fascinante, mas é só uma ferramenta. O que pode mesmo melhorar as coisas é a forma como nós, humanos, a utilizaremos. E para mim, isso é filosofia aplicada: pensar em como melhorar o meio em que vivemos, usando o que temos de mais avançado.